quinta-feira, 29 de março de 2012

«TINTA PRETA»


Seca-me a boca
De tanto silêncio,
De tantos gritos que ficaram
Entalados na garganta.
Bebo um copo de água,
A expressão inalterada
Da máquina perfeita,
Da máquina que cumpre,
Que ri quando apropriado,
Na mordaz sensatez
De ser apenas o que de si se espera.
Mordo as mãos
Do conformismo que me basta
Como se fosse o último dia
E não houvesse mais tempo
Para protelar a verdade.
Rasgo as letras no papel
Que se tinge de vermelho,
Matam e ferem
E logo se apagam.
O ser humano dura menos que um suspiro,
Frágil como um galho ao vento.
A minha mão é quanto basta
Para destruir.


ANA BRILHA, in A APOLOGIA DO SILÊNCIO (Ed. autor, a publicar em 12 Abril 2012)

quarta-feira, 28 de março de 2012

Transparência



Incomoda a transparência?
Destrói a transparência?

Céticos me rodeiam e negam a sua essência
Outros a consideram nociva

E duvido
duvido do que sou
essencialmente

quarta-feira, 21 de março de 2012

Quando a carência fala

excesso de carência
grito de consolação

a dúvida entre a não existência e o silêncio

existo pelo silêncio?

há um silêncio que me corta a possibilidade de ser, outro que me faz sentir que sou.

Para ser não digas nada, mas não partas!

Não peças, dá!

Esgoto-me... ao infinito

Dia Mundial da Poesia


Leio suspensos versos
colho poemas de sol

e contemplo

contemplo a beleza de existir
de ser e de sentir
de sofrer e de amar
de tudo dar e partir

generosamente

aguardando um abrir de porta ou O poeta e o jardineiro (1)

havia a frágil mão que batia à porta.
havia um jardim com flores de versos para oferecer à porta batida.
havia um corpo que sustinha a mão e que sofria...
...pela porta que não abria
...pela porta sem resposta
...por duvidar do seu bater
...por ter esquecido a magia de um antigo estar e ser habitado
...por não entender o mistério das portas que não abrem

mas também esse corpo tinha uma porta, uma morada. a branca e verdadeira parede moldava-se em torno da delicada porta que ali permanecia aguardando novamente ser habitada.
lá dentro refugiava-se o corpo só quando, depois de cansado bater à porta que não abria, reconstruia versos para as flores únicas que eram suas.

e havia um jardineiro que, de fora,
ao vento, à chuva e ao sol,
...guardava as flores,
...polia a delicada porta,
...cuidava das feridas da mão cansada de bater
...e consolava da solidão.

ficaria ali apenas até que uma porta abrisse e de novo a casa fosse habitada.

terça-feira, 20 de março de 2012

O mistério do abrir-fechar-bater (à) porta

sempre dar oportunidade de se exprimir a quem bate à porta. não cerrar insistentemente, nem facilitar desesperadamente.

ouvir, atender, acolher ou despedir. oferecer a claridade de sim ou não, sem ferir, sem omitir. com transparência e nudez solar.

entender o mistério de abrir e fechar. tu sim, tu já não, só aquele outro tu...

o bater constante a outras portas a vertigem de ter alguém à porta

Pode uma porta bater a outra porta e abrirem-se ambas?

segunda-feira, 19 de março de 2012

A presença ausente - PAI


Hoje
Meus lábios não te tocam
Meus braços não te enlaçam

Mas meu coração reencontra-te e segreda-te: Feliz dia do Pai

Sou o que me construiste.
Sou parte de ti,
ainda viva